Sábato, o indivíduo e o universo

 “Uno se embarca hacia tierras lejanas, o busca el conocimiento de hombres, o indaga la naturaleza, o busca a Dios; después se advierte que el fantasma que se perseguía era Uno mismo” 
Uno y El Universo - Ernesto Sábato
 
  A primeira vez que li o texto de Ernesto Sábato eu tinha dezenove ou vinte anos. Era meados dos anos 70 e ainda era possível comprar bons livros nas livrarias de Rivera, no Uruguay. No Brasil quase não existiam livrarias e as editoras eram intensamente vigiadas e censuradas pela ditadura militar. Uno y El Universo chegou nas minhas mãos quase por acaso, pois foi uma daquelas escolhas aleatórias que se faz quando se está começando a refletir sobre a própria existência.
  Naquela época eu ainda não lia filosofia. Antes tinha lido apenas romances para a escola, além de O Muro, livro de contos de Sartre, e alguns textos pedagógicos de Paulo Freire e antropológicos de Carlos Castañeda. Hoje sei que todos eles foram fundamentais para a construção do meu eu mais profundo.
 A vida era como um túnel que se abria a minha frente, e eu me sentia na obrigação de realizar aquelas reflexões básicas sobre a condição humana. Assim, aprendi a questionar a existência de Deus, sobre a necessidade de uma mínima ação, a refletir sobre o orientalismo, sobre a necessidade da fé e sobre o papel contraditório da ciência e da espiritualidade.  
Com o passar dos anos comprei mais alguns livros de Sábato, de Cortázar e de Borges, para dar continuidade àquelas reflexões contraditórias que comecei a fazer lá atrás. Agora que Ernesto Sábato morreu (abril de 2011) resolvi dedicar um texto a ele, baseado nos ensinamentos que ele me passou. Vejam o que consegui:

           Ernesto Sábato, argentino e universal



    
       
 Pessoas dogmáticas se negam a aceitar novas reflexões, pois avaliam que não vale a pena procurar explicações para questões que não foram mencionadas pelos seus velhos gurus. Elas se contentam em ficar ad-mirando fotografias de um tempo que já não existe mais, e reproduzem aquele velho e quase eterno imaginário do inferno e do paraíso, do bem e do mal, do que me agrada e do que me contradiz. Assim, com o passar do tempo, o éden e as trevas vão se armazenando como armadilhas super bem montadas nessas mentes polarizadas, e jogam com os homens, como se eles vivessem dentro de fotografias amareladas pelo tempo.

Eu não tenho dúvidas de que na primeira metade do século 20 era bem mais difícil expor um pensamento anti-dogmático. Que nos digam Sábato, Wilhelm Reich, Bertold Brecht, Hannah Arendt e outros pensadores libertários perseguidos por diferentes regimes. Ainda bem que hoje algumas psicologias e espiritualidades já conseguem reconhecer e explicar essas  complexidades, subjetividades, culturas, etnias e crenças. 

Mas foi somente após os anos 60 que quase todos os tabus foram sendo destruídos e chegamos ao que somos hoje (sem quase nos apercebermos do que realmente somos). E, se compararmos a nossa época atual com o que éramos antes das duas grandes guerras mundiais, estaremos fazendo uma reflexão histórica e existencial muito importante. Mas, se  compararmos a nossa época com o período do Czarismo e das expedições Napoleônicas, teremos turbulentas noites e noites de insônia. Apenas para lembrar, muitos brasileiros ainda eram tratados com a chibata e aqui não existia uma única universidade.

O tempo continua passando e algumas velhas representações maniqueístas seguem se manifestando nas diferentes regiões do planeta.  Em alguns territórios, estados e/ou países ainda encontramos arautos da liberdade e do novo mundo cometendo atrocidades semelhantes aos da tirania nazista ou stalinista. Apesar de todos os avanços conquistados, muitas pessoas ainda vivem diante de uma intensa perplexidade... até Barak Obama e Osama Bin Laden acabam se tornando referênciais políticas. Quanta ilusão-desilusão (uma não existe sem a outra) e quanto ceticismo ainda teremos pela frente?