Para a Dona Noemy


 
  A minha mãe nasceu numa família de músicos e hoje, quando surge uma roda, ela está sempre disposta para cantar. Lembro que lá em casa ela tocava piano, e a gente escutava Carmem Miranda, Ari Barroso, Noel Rosa, Pixinguinha, Dorival Caymmi, Francisco Alves, Dalva de Oliveira, Nora Nei, Dolores Duran, João Gilberto, Dick Farney, Nat King Cole, Frank Sinatra, Chub Checker, Elvis Presley e tantos outros. Eu nasci nos anos 50, e lembro que os adultos ainda celebravam o Pós-Guerra, com a vitória dos aliados, a vitória do Juscelino, após a trágica morte de Getúlio Vargas, a fundação da nova Capital Federal, a chegada da indústria automobilística, a luta de João Goulart pelas Reformas de Base, e até que se ouvia falar na vitória das revoluções chinesa e cubana e também na difusão da psicanálise. Em Livramento-Rivera, existiam vários cinemas e a genialidade dos filmes de Alfred Hitchcock era outra grande atração daqueles anos. A TV, o som estereofônico, o esplendor do jazz e da bossa nova e a repressão política ainda estavam por chegar.

Mas a minha "veia musical" vem de muito longe, pois a menina Noemy acompanhava os seus tios nas rádios e apresentações que aconteciam nos cinemas da cidade (veja foto acima). Na casa da minha vó e dos meus tios sempre tinha uma “seresta”, sendo que dois deles "destrossavam" o violão enquanto outros ensaiavam a percussão... Não é preciso dizer que, naquelas reuniões de família a cantoria se estendia tranquilamente pela madrugada... Mas, de vez em quando, os meus irmãos davam um show de “twist” para que o pessoal conhecesse “aquela dança diferente que surgia”. Assim, sempre de uma maneira simples, ingênua e divertida, fomos nos sensibilizando com todo o tipo de música.  O meu pai, que na época era rádio- amador, fazia a parte dele, gravando as cantorias, que depois convertia em discos de 78 rotações.

Foi neste ambiente, mas no final dos anos 60, que eu comprei o meu primeiro Compact Disc. Lembro que era para comprar uma máscara de mergulhar e que, na hora, resolvi trocar por um disco dos Beatles, com o título de “Twist and Shout”. Acho que depois disso nunca mais me separei do prazer de pesquisar e de escutar música. Até porque o meu irmão Lica também comprava muitos discos, e eu aproveitava “a carona” conhecendo, escutando e “pegando” alguns novos compositores, quando ele se descuidava. Mas, no final dos anos 70, quando eu morava na Praia do Laranjal, em Pelotas, me roubaram mais de quinhentos LPs, que eu nunca mais consegui recuperar. Ainda bem que sobraram alguns, recuperei muitos em CD e agora temos a internet para pesquisar e baixar os preferidos. 

Na minha adolescência, escutei de tudo um pouco: além dos já citados, curti Roberto e Erasmo Carlos, Renato e seus Blue Caps, Lafayette e sua Orquestra, e também João Gilberto, Chico Buarque, Tom Jobim, Paulinho Nogueira, Maria Bethania, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Rogério Duprat, Antônio Adolfo, Bob Dylan, Joan Baez, The Doors, The Birds, Joe Cocker e claro, The Beatles e Rolling Stones. Dei umas circuladas pelo rock and roll e Boogie-Woogie do T.Rex e pela guitarra psico-libertária do Jimmy Hendrix. No final dos anos 60, Simon and Garfunkel tocava em todas as rádios, pois a trilha do filme A Primeira Noite de um Homem era toda deles. James Taylor e Carole King também faziam um enorme sucesso com You've got a friend. Nesta época de Woodstock, curti o álbum todo do festival, mas me impressionava a qualidade do Pearl e Kosmic Blues, da Janis Joplin e dos Soul Sacrifice e Abraxas, do Santana. Depois, numa época de rebeldias e de resistência democrática, entraram na minha vida musical o América, o Pink Floyd, o Jethro Tull, o Led Zeppelin, o Miles Davis, o J.J.Cale, o John Mayall, o Egberto Gismonti, o Hermeto, o Moleque Gonzaquinha, o Milton Nascimento, a Mercedes Sosa, a Elis e tantos outros... Mas tudo isso é papo para muitas madrugadas...

Agora, quando estamos experimentando um período mais estável e mais longo de democracia, estou vivendo uma fase light da minha sensibilidade musical, sem desprezar nenhuma daquelas  heranças musicais. Se é verdade que “quem puxa aos seus não degenera”, tenho que agradecer à Dona Noemy e à família Nascimento Marques pelo prazer artístico e musical que eles me transmitiram.

Gracias, viejos muchachos y muchachas.

3 comentários:

  1. Parabéns Ricardo pela mãe que tens,nos nossos encontros de musica,CONFRARIA DA MUSICA-LIVRAMENTO ela da SHOW CANTANDO é admirada por todos!!!E como é lindo poder estar disfrutando destes momentos,a musica sempre fez parte da nossa familia.A foto que colocastes diz tudo.Bjosss

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    1. Tia Ruiva, que bom dividir contigo estas palavras. Mas acho que todos se ad-miram mutuamente, com aquele olhar fraterno e franco... Simplesmente assim se faz uma boa seresta. Não é? Beijos

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